Os casos de cólera notificados em África em janeiro deste ano excederam em 30% o número total de infeções no continente em 2022, uma tendência ascendente “preocupante” exacerbada pelos conflitos e fenómenos climáticos, alertou hoje a OMS
A directora regional da Organização Mundial da Saúde para África disse que a OMS está a assistir a um cenário preocupante em que o conflito e os acontecimentos climáticos extremos estão a agravar o desencadeamento da cólera.
Com surtos ativos desde o início de 2023 em 10 países, África registou cerca de 26 mil casos e 660 mortes, só em janeiro, de acordo com a OMS, enquanto quase 80 mil casos e 1.863 mortes foram detetados em 15 países no ano passado.
Em países como a Etiópia, Somália e Quénia, os surtos foram agravados pela seca devastadora no Corno de África, a pior dos últimos 40 anos, que forçou a deslocação maciça da população e dificultou o acesso à água e ao saneamento.
Países como a Nigéria, Burundi, Camarões, Zâmbia, Moçambique e a República Democrática do Congo também foram afetados, onde a província com mais casos é o Kivu do Norte, atingida pela violência dos grupos armados que operam no nordeste do país.
Nesta província, que é montanhosa em muitas áreas – o que significa que a população só tem acesso a água potável quando esta é transportada por camião -, o reinício dos combates em março passado entre os rebeldes do Movimento 23 de Março e o exército congolês levou à deslocação de mais de meio milhão de pessoas.
Contudo, o país mais duramente atingido foi o Malawi, onde um surto declarado em março se tornou o “mais mortal” da sua história, com 40.284 casos e 1.316 mortes até à data, de acordo com os últimos dados do Ministério da Saúde do país, citados pela OMS.
Além disso, a taxa de mortalidade da doença no continente é quase de 3%, acima do limiar de 1% estabelecido pela organização.
A multiplicação de casos a nível mundial, com 18 países afetados, colocou “grande pressão” sobre a disponibilidade de vacinas a nível mundial, disse a OMS, forçando o grupo que gere o stock internacional (OMS, Médicos Sem Fronteiras, Federação Internacional da Cruz Vermelha e Unicef) a reduzir, em outubro passado, as doses administradas, de duas para uma.
Neste contexto, o Malawi anunciou em meados de janeiro que tinha esgotado todas as doses de que dispunha para enfrentar o surto, uma situação que ainda tem de remediar.
A cólera é uma doença diarreica aguda causada pela ingestão de alimentos ou água contaminada. Segundo a OMS, continua a ser “uma ameaça global para a saúde pública e um indicador de desigualdade e de falta de desenvolvimento”.